FESTFOTOPOA 2012

Terminou ontem a semana “quente” do VI Festival Internacional de Fotografia de Porto Alegre. Este ano o FestFoto, como é mais conhecido, foi adiado várias vezes e esteve ameaçado de não acontecer, devido a dificuldades com a captação do patrocínio via Lei Rouanet, mas felizmente foi viabilizado. Na pilotagem da equipe  desde a primeira edição está o incansável realizador Carlos Carvalho, carioca que adotou Porto Alegre como domicílio. Este ano a fotógrafa homenageada foi a paulista Nair Benedicto, figura emblemática do fotojornalismo e do documentarismo brasileiro, com quarenta anos de estrada.

Depois de voltar da Semana de Fotografia de Caxias (veja o post anterior), participei, dessa vez só como espectador, da abertura da exposição da Nair e do FestFoto, na terça-feira dia 21 de agosto, e do segundo dia, quando a fotógrafa homenageada participou de uma mesa redonda e lançou o livro com uma retrospectiva do seu trabalho. A exposição ficou muito interessante, e foi  montada no saguão de entrada do Memorial do Rio Grande do Sul, um belo prédio histórico no centro de Porto Alegre, onde aconteceram todas as atividades do FestFoto 2012. As fotos foram montadas na frente e no verso de uma placa e suspensas no teto com finos cabos de aço. O resultado vocês podem conferir abaixo ou ao vivo até 30 de novembro.

Na quarta-feira 22 de agosto assisti a mesa – A experiência das agências independentes da década de 80 – onde Ricardo Chaves, o Kadão do jornal Zero Hora, (que será o homenageado do FestFoto 2013) contou sua experiência na Focontexto e nos divertiu com suas histórias sempre bem contadas e bem humoradas. Depois dele o fotógrafo Juca Martins falou sobre a história da agência F4, que montou com Nair Benedicto e Ricardo Malta em São Paulo, e marcou época no fotojornalismo brasileiro, principalmente pela valorização dos direitos dos fotógrafos.

A seguir aconteceu a mesa redonda com a Nair Benedicto, que foi marcada por muita emoção, pois dela participaram as principais jornalistas parceiras da autora durante sua carreira, além de uma das suas filhas. Nair e as colegas relembraram episódios de diversas matérias publicadas pela imprensa brasileira ao longo de sua vida. Depois de encerrada a mesa aconteceu o lançamento do livro “Vi ver” da Nair, uma retrospectiva de sua trajetória fotográfica com edição das fotos por Célio Rosa, Fausto Chermont, Juca Martins, Ricardo Tilkian (que também assina o projeto gráfico), Salomon Cytrynowicz e da própria Nair. Os textos são de Andréia Peres, Atenéia Feijó, Iza Salles, Junéia Mallas, Laís Tapajós, Rubens Fernandes Júnior, Siã Osai Sales-kachinawa  e da Nair.

Nair Benedicto e Luis Carlos Felizardo, o homenageado do FestFoto 2011. Foto de Vinícius Roratto Carvalho
Capa do livro “Vi Ver” de Nair Benedicto.

A FOTOGRAFIA INVADE CAXIAS

Terminou ontem com uma saída fotográfica na UCS a 5ª Semana da Fotografia em Caxias do Sul, RS. Foram 10 exposições fotográficas, 9 palestras, 3 oficinas, exibições de filmes e o Foto Escambo. Eu ministrei uma oficina de fotografia de natureza, que teve um aula teórica sexta feira na sede do Clube do Fotógrafo e uma saída a campo no sábado no Mato Sartori, uma unidade de conservação de 6,6 hectares administrada pela Prefeitura Municipal que fica dentro da cidade.

Na sexta-feira 17 de agosto de manhã, recebi três turmas de crianças na Galeria de Arte do Centro Municipal de Cultura Dr. Henrique Ordovás Filho, onde foi montada a minha exposição fotográfica “Expedição Natureza Gaúcha”. As crianças eram da Escola Preparatória de Dança da Secretaria Municipal da Cultura,  da Casa Abrigo Sol Nascente e da comunidade. Foi muito legal recebê-las e falar do meu trabalho, da minha preocupação com a natureza e a forma com que o ser humano se relaciona com ela. As crianças do Abrigo Sol Nascente são crianças que viviam situações de risco, foram tiradas de suas famílias e estão sob tutela judicial. Foi muito emocionante o carinho com que retribuíram a atenção que dediquei a elas.

Visita das escolas na Galeria de Arte do Centro Cultural Ordovás.

Na sexta a tarde aproveitei para visitar duas exposições fotográficas.A primeira foi a excelente coletiva monocromática “Preto no Branco” do Clube do Fotógrafo de Caxias, na belíssima Galeria Municipal de Arte Gerd Bonheim na Casa de Cultura, onde pude ver as fotos premiadas na XXVI Bienal de Arte Fotográfica Brasileira em Preto e Branco, que aconteceu este ano em São José do Rio Preto, SP. A outra exposição que visitei foi “A Cor da Luz no Olhar de Mauro de Blanco”, no Museu Municipal, retrospectiva histórica do trabalho do fotógrafo que documentou a vida da cidade desde a década de 40 até 2010, quando faleceu.

Exposição “Preto no Branco” do Clube do Fotógrafo de Caxias, Galeria Municipal de Arte na Casa de Cultura de Caxias do Sul.
Foto “Esculturas do Vento” de René Rossi, premiada com menção honrosa na XXVII Bienal de Arte Fotográfica, Exposição “Preto no Branco” do Clube do Fotógrafo de Caxias, Galeria Municipal de Arte na Casa de Cultura de Caxias do Sul.
Foto de Estevão Bordin, do Clube do Fotógrafo de Caxias do Sul, premiada com o primeiro lugar na XXVII Bienal de Arte Fotográfica Brasileira em Preto e Branco.

Na sexta a noite foi a aula teórica da minha oficina, na sede do Clube do Fotógrafo. Eram 38 alunos atentos e participativos que ficaram até as 23h escutando minhas histórias. No dia seguinte dividimos as turmas em duas para a saída a campo no Parque Municipal Mato Sartori, para que eu pudesse dar mais atenção a todos os alunos. Destaque nas trilhas para a pinguela, uma bela ponte pênsil de madeira; um senhora árvore de 300 anos chamada “carrapicho” e um mirante de onde se vê a cidade de dentro da Mata Atlântica.

Aula prática da oficina de fotografia de natureza no Parque Municipal Mato Sartori. Foto de Evandro Cesar Modesto.
Aula prática da oficina de fotografia de natureza no Parque Municipal Mato Sartori. Foto de Evandro Cesar Modesto.
Aula prática da oficina de fotografia de natureza no Parque Municipal Mato Sartori. Foto de Zé Paiva.
Aula prática da oficina de fotografia de natureza no Parque Municipal Mato Sartori. Foto de Severino Schiavo.

No sábado a noite encerrei minha participação com uma sessão de autógrafos do meu livro “Natureza Gaúcha” no Centro de Cultura Ordovás. Aproveito para agradecer a todos os organizadores do evento, em especial aos amigos Luis Fernando Barp, do Clube do Fotógrafo de Caxias do Sul, meu motorista, guia e guarda-costas (segundo ele mesmo) e Carine Turelly, da Unidade de Artes Visuais da Secretaria Municipal de Cultura, responsável pela galeria onde está minha exposição.

SERVIÇO

Exposição Natureza Gaúcha
Local: Galeria de Arte do Centro de Cultura Ordovás
Visitação: 16 de agosto a 6 de setembro de 2012
Horário: segunda a sexta das 9h as 19h – sábados das 15h as 19h
Endereço: Rua Luiz Antunes, 312 – Bairro Panazzolo -Caxias do Sul RS
Telefones: (54) 3218.6192 / 3901.1316

Tocantins Ecológico

A editora Empresa das Artes lançou mais um guia turístico, dessa vez sobre o Tocantins, o mais novo estado brasileiro (foi criado em 5 de outubro de 1988). O guia tem foco nas atrações ecológicas, históricas e culturais e portanto foge do formato dos tradicionais guias turísticos, que normalmente se atêm as atrações convencionais.

A Empresa das Artes já tem uma tradição neste segmento de guias, contando com mais de vinte publicações no seu catálogo.

Neste guia especificamente foram usadas 24 fotos minhas das paisagens e da fauna dos parques tocantinenses: Parque Estadual do Lajeado, Parque Estadual do Cantão, Parque Estadual do Jalapão e Parque Nacional do Araguaia.

[slideshow]

Destaque no guia para a introdução histórica, com uma linha do tempo, e para a grande quantidade de informações sobre a cultura local, com direito até a receitas típicas da região.

Ficha Técnica
Título: “Guia Turístico Tocantins – Ecológico, Histórico e Cultural”
Formato do livro:  11,5 x 21,0 cm
Miolo:  em papel couché, impresso a 4 X 4 cores.
Nº de páginas: 240
Preço: R$ 35,00

Natureza Gaúcha no Ipad

O livro  Expedição – Natureza Gaúcha do fotógrafo Zé Paiva vai ganhar uma versão para iPad. Lançado originalmente em 2008, o livro traz imagens da fauna e flora gaúcha registradas sob o olhar poético do fotógrafo. Paiva percorreu mais de cinco mil quilômetros do território rio-grandense para extrair o que há de mais peculiar do pampa ao litoral, da serra às planícies.

Para fazer a transição para o novo formato ele conta com o apoio do fotógrafo André Nery, um dos primeiros a trabalhar com essa nova tecnologia. “ Com essa ferramenta, além de incluir fotos que ficaram de fora da versão impressa, vamos poder trazer outros elementos, como vídeos e imagens em 360º ”, explica André. Esse material complementar vai ser produzido até o final do ano.

Ambos acreditam muito no potencial dessa nova forma de mídia, tanto pela interatividade como pelo alcance global. “Estou muito empolgado com as novas possibilidades que podem se abrir ”, afirma Zé Paiva.

A versão para iPad será bilíngue e tem lançamento previsto para o primeiro semestre de 2012 na loja do iTunes.

somos estrelas

“Este é um livro que pretende unir a ciência ao sagrado”. Assim inicia o “Somos Terra”, lançado pela Editora Auana. Este livro é resultado de um projeto concebido pela escritora Ana Augusta Rocha, com o intuito de trazer para crianças e jovens a consciência de que somos parte indissociável do Planeta. Além do livro, o projeto apresenta, até 31 de agosto, uma exposição interativa, idealizada pelo arquiteto e cenógrafo croata Marko Brajovic no espaço da UMAPAZ, no Parque do Ibirapuera.

Tive a felicidade de participar desse projeto inovador com a foto abaixo, que faz parte do capítulo “a teia da vida”.

Só pra dar um gostinho, transcrevo abaixo um trecho do excelente texto de Ana Augusta:

“Precisamos nos lembrar de nunca esquecer. Tudo neste planeta, eu , você, todas as vidas, tem como origem as estrelas. Nós somos partículas de estrelas que um dia brilharam no céu, que depois formaram a Terra e que criaram a vida. Por mais estranho que possa parecer, somos estrelas. Feitas para brilhar.”

Natureza Gaúcha na Cultura

Caros amigos

Dia 12 de maio de 2011 – quinta feira – estarei recebendo todos para um encontro no auditório da Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country em Porto Alegre. Na ocasião vou projetar imagens do livro e falar um pouco sobre este projeto. Também vou mostrar imagens inéditas do projeto que estou trabalhando no momento – Expedição Natureza do Tocantins – com lançamento previsto para o segundo semestre deste ano. Na ocasião acontecerá a abertura da exposição fotográfica do Natureza Gaúcha. Estão todos convidados! Saiba mais sobre o livro aqui.

[slideshow]

Onde: Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country em Porto Alegre

Quando:12 de maio de 2011 – quinta feira – as 19h30

Mais detalhes aqui neste link.

Filmes, livros e sítios

13 dicas de filmes, livros e sítios na internet, sobre fotografia ou natureza, e algumas vezes sobre os dois juntos. Originalmente publicado no blog da ESPM Porto Alegre, onde dou uma master class de fotografia de natureza no Curso Avançado de Fotografia Digital.

Sites:

Ashes and snow, foto de Gregory Colbert.

Ashes and Snow:
Ashes and Snow é um projeto do artista canadense Gregory Colbert. Ele é formado por fotos, filmes e um romance e foi exibido em um museu itinerante, o Nomadic Museum. O trabalho explora as relações entre humanos e animais e foi visto por mais de 8 milhões de pessoas em cidades como Veneza, Nova Iorque, Santa Mônica, Tóquio e Cidade do México. Esta é a exposição de um artista vivo mais visitada de todos os tempos.

AFNATURA:
Portal da Associação de fotógrafos de natureza, onde é possível se associar e acompanhar a divulgação de oficinas e exposições.

Jim Brandenburg:
Site do fotógrafo Jim Brandenburg, que trabalhou para a National Geographic por 30 anos. Além de uma vasta amostra da obra de Brandenburg, comercializa fotos, livros e dvds do artista.

Life Through Time:
Fala sobre o projeto Life, que aborda a diversidade da vida na Terra, desde seus primórdios até os dias atuais. A obra é realizado através da integração da fotografia (LIFE Book), Orchesta (LIFE Music), uma amostra itinerante (LIFE Exhibits) e o próprio site. O responsável pelo projeto é o fotógrafo holandês Frans Lanting.

International League of Conservation Photographers
É uma organização baseada em projetos que busca conscientizar as pessoas sobre a conservação ambiental através de fotografias. De caça ao aquecimento global, perda de habitat para a erosão cultural, a sustentabilidade de corredores biológicos, o trabalho de fotógrafos iLCP abrange toda a gama de ameaças à biodiversidade.

Livros:

Foto de Luiz Carlos Felizardo.

A Câmara Clara – Roland Barthes
Último livro escrito pelo filósofo Roland Barthes, propõe uma reflexão sobre a imagem fotográfica e sobre a vida e a morte.

Imago – Luiz Carlos Felizardo
Traz textos de autoria do fotógrafo porto-alegrense Luiz Carlos Felizardo,  publicados na revista Aplauso. O fotógrafo será o homenageado no 5º FestFoto Poa, que acontecerá de 6 de abril a 1º de maio de 2011.

Satolep – Vitor Ramil
Romance que tem como protagonista um fotógrafo que volta a Satolep, sua cidade natal. A história se passa no início do século 20 e tem “personagens” ilustres como o poeta João Simões Lopes Neto, o jornalista Lobo da Costa e o cineasta Francisco Santos.

Mar de Homens – Roberto Linsker
Esta publicação apresenta 92 fotos que retratam o dia a dia de pescadores artesanais. Linsker iniciou o trabalho em 1997 e percorreu a costa brasileira em busca de imagens que representassem a dura rotina desses trabalhadores.

Chased by the Light – Jim Brandenburg
Este é um livro emblemático para mim, pois acho incrível a disciplina que o mestre Brandenburg teve que ter para realizar este projeto. Durante 90 dias, entre o o equinócio de outono e o solstício de inverno, Brandenburg desafiou a si mesmo e fez apenas uma fotografia por dia, em filme. O resultado pode ser visto nesta publicação, que não foi lançada no Brasil.

Filmes:[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=89Qv44Kn4Bc]
Na natureza selvagem
Dirigido por Sean Penn, conta a história verídica de Christopher McCandless, um jovem americano que decide abandonar tudo para chegar até o Alasca e poder viver isolado na natureza, longe da civilização.  Além de uma ótima história bem filmada, a trilha do Eddie Vedder (Pearl Jam) é de primeira!

Ashes and Snow
Este é o documentário da exposição Ashes and Snow. O filme mostra a harmonia entre humanos e animais num país fictício em aproximadamente uma hora de documentário poético.

Antes da chuva
Este longa traz dois personagens que tem relação com a fotografia: Anne, editora de uma agência de fotos, em Londres e Aleksander, fotógrafo de guerra. Conflitos étnicos-religiosos entre os Macedônios ortodoxos e muçulmanos Albaneses são o pano de fundo para os dilemas existenciais do fotógrafo que volta a sua terra natal.

Lixo Extraordinário:
Conta o trabalho do fotógrafo e artista plástico Vik Muniz, que durante dois anos registrou o dia a dia de catadores em um dos maiores aterros sanitários do mundo, o Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro. Concorreu ao Oscar de melhor documentário este ano.

O DNA da paisagem

livro Expedição Natureza Gaúcha estará na Biblioteca do Fórum Internacional de Livros de Autor, dentro do 5º FestFotoPoa, que acontece de 6 de abril a 1º de maio de 2011. Leia na íntegra o brilhante prefácio do livro, escrito pelo doutor em ecologia da paisagem, professor Rualdo Menegat:

Sitio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, Missões Jesuíticas dos Guaranis

A identidade de cada pessoa é indissociável da paisagem e do lugar onde nasceu. O lugar é uma espécie de sobrenome invisível: embora não conste na certidão de nascimento, possui a mesma importância do sobrenome, como se fizesse parte da natureza humana. Quando conhecemos alguém pela primeira vez, logo perguntamos onde essa pessoa nasceu e onde vive. Também costumamos falar de sobrenomes endereçando-os a algum lugar, como os Vargas, de São Borja; os Verissimo, de Cruz Alta; os Scliar, do bairro Bom Fim; os Barbosa Lessa, de Piratini; os Lopes, de Bagé. A cultura ameríndia também tinha endereço natural, como os caingangues, do Planalto Meridional; os guaranis, das Missões; ou os minuanos, do Pampa.

Cada lugar tem características tão próprias que poderíamos pensá-lo como se portasse uma impressão digital ou um DNA que lhe fossem únicos. Porém, diferentemente dos genes dos ancestrais, os “genes do lugar” não ficam automaticamente registrados no organismo. Mas ficam impregnados, desde que nascemos, em nosso espírito e cultura de modo indissociável. Seja a língua, o sotaque, a comida, os jogos, a religião, tudo está profundamente influenciado pela paisagem, onde a cultura vai sendo cotidianamente construída.

A paisagem é a moldura de nossa cultura e, ao mesmo tempo, define os limites e possibilidades de expansão desta. A cultura desenvolvida pelos ticunas no alto Solimões não é adequada para a vida nos Andes Centrais, pois considera fundamentalmente a paisagem da Floresta Amazônica. Do mesmo modo, a cultura dos incas, no Peru, forjada pela natureza inóspita das altas montanhas andinas, não se adapta às terras baixas e planas do grande Pampa. Uma cultura torna-se tão circunscrita à paisagem que tem dificuldades de se adaptar a outros lugares. Tal restrição ocorre porque quando uma cultura domestica a paisagem ao longo do tempo ela ajusta os instrumentos culturais, desde habitação até visão de mundo, àquele lugar. O processo de domesticação não é outro senão a transferência do DNA do lugar à cultura, e vice-versa, de modo que ambos se pertençam. Isto é, ao ver a paisagem, logo identificamos o personagem que a habita, e, ao ver este, de imediato pensamos na paisagem.

Quando a paisagem é domesticada, passa a ser importante ingrediente de coesão de grupos humanos. Toma parte das qualidades peculiares de um povo, integrando-lhe o caráter, o modo de ser, como em “ser gaúcho”, ou “ser pampiano”, “serrano”, “missioneiro”, “litorâneo” etc. Fazemo-nos pertencer ao lugar, às vezes, sem mesmo conhecê-lo apropriadamente. Embora possamos não ter visitado todas as paisagens do Estado, dizemo-nos mesmo assim “gaúchos”, às vezes sem nem sequer ter saído do lugar em que nascemos. Por força do hábito, podemos enxergar para além da própria realidade da paisagem, e a vemos mais do ponto de vista cultural que do ponto de vista da descrição natural, de como ela é de fato. Como se criássemos certos mitos acerca do lugar, numa espécie de cegueira.

Por exemplo, com frequência dizemos que o Pampa gaúcho é uma “enorme planície”. Com isso, queremos fazê-lo parecer semelhante ao vasto Pampa argentino, ecorregião que abrange cerca de 600.000 quilômetros quadrados, mais do que duas vezes a área do Rio Grande do Sul. O Pampa argentino é tão extenso e as terras tão planas que a drenagem é mal definida e a água da chuva escoa com dificuldade, acumulando-se em lagos por vezes efêmeros. Originalmente, a palavra espanhola pampa, derivada do quéchua bamba, significava apenas uma pequena planície nos vales intermontanos dos Andes Centrais. Quando no século XVI os espanhóis avançaram rumo ao sul e depararam com a imensidão da paisagem de terras planas e vegetadas por gramíneas, chamaram-na de “grande pampa”.

Na verdade, a área de terras verdadeiramente planas e baixas de nosso Estado é muito pequena. Não temos nem planícies em vales intermontanos nem tampouco grandes extensões planas. Em algumas partes, o relevo é ondulado, com coxilhas e morros arredondados, canais fluviais sempre bem escavados; e, em outras, acidentado, com vales fluviais profundos, morros agudos, serras, escarpas e cânions. Toda essa morfologia ocorre na metade sul do Estado, reconhecida como pampiana.

Dito de outro modo, nosso Pampa tem paisagens muito menos monótonas que o congênere argentino. Em muitos casos, a paisagem sulina é tão peculiar que há um esforço para não vê-la, apenas para fazer de conta que somos semelhantes aos vizinhos do grande Pampa. Indiscutivelmente, nossa cultura é pampiana, o que não quer dizer que nossas paisagens sejam exatamente iguais às das demais culturas pampianas dessa vasta região meridional da América do Sul.

Há, na verdade, uma diversidade de gaúchos na mesma medida da diversidade das paisagens onde essa cultura se instalou e se expandiu. Dizem-se gaúchos os que habitam a Patagônia, onde criam ovelhas nas zonas mais amenas desse semideserto da região mais meridional e fria de nosso continente. Também se dizem gaúchos os que povoam grande parte do Chaco argentino-paraguaio e até do Pantanal Mato-Grossense, onde criam gado e tomam mate frio, o tereré. São gaúchos os que ocupam a área contígua ao Rio Grande do Sul chamada de Campos Sulinos, no vizinho Uruguai; e, claro, são gaúchos os que lidam com o gado e tomam mate quente, porém em cuia pequena, na imensa planície argentina chamada de grande Pampa.

Enfim, as vastas terras baixas e planas que se estendem desde a fria Patagônia e grande Pampa até parte do Chaco paraguaio-argentino e respectivas áreas adjacentes um pouco mais elevadas ensejaram uma ocupação humana que possui forte identidade na cultura do manejo de gado, chamada de “gaúcha”. Na ampla configuração de nosso cenário, qual seja, a parte não andina da região meridional da América, somos a porção do extremo oriente dessa cultura, habitando uma espécie de “‘pampa alto”, “pampa coxilhado” ou “pampa serrano”. Assim como também pertencem a um “pampa alto”, porém paisagisticamente distinto, os que habitam as terras elevadas no bordo oeste do Pampa argentino, mais próximo dos Andes.

Visitar o lugar do outro, do vizinho, do estrangeiro longínquo, é sempre um exercício cognitivo e cultural que ajuda a descobrir a própria paisagem para além do hábito que cegamente vamos mantendo. Do mesmo modo, quando outras pessoas que não moram onde vivemos vêm descrever “nosso lugar”, aprendemos a ver a terra pelos olhos daqueles que não estão a ela habituados, isto é, embebidos em uma espécie de cego encantamento.

O hábito, por ser muito afeiçoado ao lugar, não permite que vejamos a paisagem a partir de outras perspectivas ou pontos de vista que não sejam “o nosso”, quer dizer, de nossa identidade cultural aderida ao território. Por isso, as narrativas de viajantes sempre foram um gênero literário de muito sucesso em todas as épocas. A começar pelas mais antigas, como as Historias do grego Heródoto, o “pai da História”, que no século V a.C. descreveu no livro II o mundo egípcio com horror e fascínio e nos fez ver que cultura, etnografia e história pertencem ao lugar. Ou as do veneziano Marco Polo, que narrou no livro Il Milione a viagem ao então estranho mundo oriental no século XIV. Ou as consagradoras descrições dos naturalistas românticos do século XIX, em que se incluem as de ilustres sábios que visitaram o Rio Grande do Sul, como Auguste Saint-Hilaire, Aimé Bonpland, Friedrich Sellow, entre outros.

O trabalho de naturalistas e viajantes constitui fonte de conhecimento de nossa paisagem a partir de outras perspectivas. Mais além, são também uma memória das mudanças paisagísticas que ocorreram desde épocas em que os únicos instrumentos de registro eram a escrita e o desenho em cadernetas de campo. Os trabalhos poderiam ser acompanhados de coleta de espécimes vegetais, animais e minerais, bem como de belas aquarelas. No século XX, principalmente a partir da consolidação dos cursos universitários de História Natural nos anos 1950, os relatos de viagem que integravam várias modalidades disciplinares foram perdendo terreno, e o gênero quase desapareceu.

Por isso, a publicação desta obra do fotógrafo Zé Paiva é motivo de grande e estupenda alegria. Utilizando-se de recursos modernos, do arsenal de equipamentos fotográficos e adequada logística, brinda-nos com uma incursão pela paisagem gaúcha que recupera a ideia dos percursos de uma viagem naturalista. Em vez de longos textos, Paiva apresenta uma obra numa linguagem visual própria da contemporaneidade. Mas suas fotografias não são a busca do óbvio, de imagens já muito difundidas em cartões-postais. Longe disso, o autor apresenta sequências inseridas dentro de incursões pela paisagem do Escudo Sul-Rio-Grandense, Planalto Meridional, Depressão Periférica e Planície Costeira. Os percursos, por sua vez, são localizados dentro da diversidade de paisagens que compõem as ecorregiões gaúchas.

Assim, o leitor poderá acompanhar o espírito de aventura, de busca, de investigação de um amplo espectro de temas que conformam o DNA de uma paisagem. Dos elementos rochosos, vegetais, animais, capturados em detalhes de rara composição. Do conjunto paisagístico denotado pelas formas do relevo, nuvens e cores do céu. De expressões culturais de habitantes de regiões distantes, ermas, onde se fabrica a simbiose dialética entre cultura e paisagem. São flagrantes fotográficos que anunciam nossa condição neste mundo: de espectadores e, também e cada vez mais, de modificadores da paisagem.

A incursão de Zé Paiva é uma busca instigante da natureza recôndita, aquela que ainda está de alguma forma guardada em parques e áreas de preservação. É um modo sutil de anunciar o pouco que resta e o tanto que perdemos ou que ainda podemos perder. Por ser fruto de um viajante que segue os passos da cognição naturalista, a obra tem perspectiva, tem posição: a de mostrar em cada flagrante como a natureza é bela e diversa na sua própria naturalidade, isto é, para além dos clichês habituais que porventura aprisionam as múltiplas paisagens de nosso Estado.

Lagarto-da-praia

Mais um trabalho pai-e-filho: o GIPEDU (grupo interdisciplinar de pesquisa em ecologia e desenho urbano) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), capitaneado pelo Professor Francisco Ferreira, lançou o livro “Projeto Parque Estadual do Rio Vermelho – subsídios ao plano de manejo”. O parque é uma área de 1532 hectares na costa leste da Ilha de Santa Catarina, que depois de 45 anos de uma tumultuada história foi promovido a parque estadual e enquadrado no Sistema Estadual de Unidades de Conservação SEUC, passando assim para a administração da FATMA (Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina). O plano de manejo de um parque é algo parecido com o plano diretor de uma cidade: delimita as diferente zonas e usos da área da unidade e do seu entorno. Através de recursos do Ministério do Meio Ambiente, o Instituto Lagoa Viva, em parceria com o GIPEDU, idealizou e executou este projeto, que além de realizar um diagnóstico da área e uma proposta de zoneamento, desenvolveu diversas ações junto as comunidades do entorno.

Eu fiz diversas saídas e sobrevôos para fotografar a região, e Maurício Paiva, meu filho, foi o responsável pelo design gráfico do livro e de duas cartilhas, sendo a segunda para o público infantil. O lagarto-da-praia, um animal endêmico encontrado na Praia do Moçambique, que fica dentro do parque, foi inspiração para Maurício criar um personagem na primeira cartilha. Na segunda cartilha, lançada junto como o livro e voltada para o público infantil, o lagartinho foi parar na capa!

Capa do livro "Projeto Parque Estadual do Rio Vermelho" - design de Maurício Paiva e foto de Zé Paiva
Capa da cartilha infantil sobre o Parque Estadual do Rio Vermelho - Design e ilustração de Maurício Paiva e foto aérea de Zé Paiva

Satolep – Lançamento do Natureza Gaúcha

Impregnado pela estética do frio (termo criado pelo cantor, compositor e escritor Vitor Ramil, de Pelotas), apesar da temperatura amena, respiro o ar outrora pestilento pelas carnes putrefatas. O arroio Pelotas era conhecido como o Rio Vermelho, tamanha a quantidade de sangue que desaguava no seu leito. Fortunas foram criadas a partir de um trabalho feito por mão-de-obra escrava. A ganância do ser humano engendra formas desumanas de produção. Hoje as charqueadas são lugares turísticos, limpos e ajardinados, com criancinhas correndo pelos casarões. Em nada lembram os lugares descritos por Debret.

Pousada Charqueada Santa Rita, Pelotas, Rio Grande do Sul.

O nome da cidade de Pelotas veio de uma embarcação pitoresca usada pelos índios, feita de couro e madeira, puxada a nado por uma corda mordida pelo nadador. Na noite anterior a minha ida às charqueadas de Santa Rita, que hoje é uma bela pousada, e a Charqueada São João, hoje transformada em Museu, aconteceu o evento de lançamento do meu livro Natureza Gaúcha em Pelotas. No auditório do Instituto Simões Lopes Neto (antiga residência do escritor) fiz uma projeção de fotografias e depois uma conversa com um público de cerca de cinquenta pessoas que quase lotou o espaço. Muitos alunos e professores dos cursos de artes, ecologia e fotografia animaram a conversa que se extendeu até cerca de nove e trinta da noite, quando então passamos a sessão de autógrafos. Agradeço a Bety e toda a equipe da excelente Livraria Vanguarda que me convidou e organizou todo o evento.

Auditório do Instituto Simões Lopes Neto, Pelotas, RS.
Vitor Ramil (a esquerda) na noite do evento.

Pelotas é uma cidade encantadora, repleta de prédios antigos, alguns restaurados e outros nem tanto. Fui ciceroneado pelo músico Vitor Ramil e sua esposa Ana Ruth, professora de linguística. Entre longas conversas regadas a mate amargo, fotografei um pouco da cidade (vejam mais fotos na galeria do Flickr)

Prédio antigo na praça General Osório em Pelotas RS.
Instituto Simões Lopes Neto, Pelotas, Rio Grande do Sul.