O DNA da paisagem

livro Expedição Natureza Gaúcha estará na Biblioteca do Fórum Internacional de Livros de Autor, dentro do 5º FestFotoPoa, que acontece de 6 de abril a 1º de maio de 2011. Leia na íntegra o brilhante prefácio do livro, escrito pelo doutor em ecologia da paisagem, professor Rualdo Menegat:

Sitio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, Missões Jesuíticas dos Guaranis

A identidade de cada pessoa é indissociável da paisagem e do lugar onde nasceu. O lugar é uma espécie de sobrenome invisível: embora não conste na certidão de nascimento, possui a mesma importância do sobrenome, como se fizesse parte da natureza humana. Quando conhecemos alguém pela primeira vez, logo perguntamos onde essa pessoa nasceu e onde vive. Também costumamos falar de sobrenomes endereçando-os a algum lugar, como os Vargas, de São Borja; os Verissimo, de Cruz Alta; os Scliar, do bairro Bom Fim; os Barbosa Lessa, de Piratini; os Lopes, de Bagé. A cultura ameríndia também tinha endereço natural, como os caingangues, do Planalto Meridional; os guaranis, das Missões; ou os minuanos, do Pampa.

Cada lugar tem características tão próprias que poderíamos pensá-lo como se portasse uma impressão digital ou um DNA que lhe fossem únicos. Porém, diferentemente dos genes dos ancestrais, os “genes do lugar” não ficam automaticamente registrados no organismo. Mas ficam impregnados, desde que nascemos, em nosso espírito e cultura de modo indissociável. Seja a língua, o sotaque, a comida, os jogos, a religião, tudo está profundamente influenciado pela paisagem, onde a cultura vai sendo cotidianamente construída.

A paisagem é a moldura de nossa cultura e, ao mesmo tempo, define os limites e possibilidades de expansão desta. A cultura desenvolvida pelos ticunas no alto Solimões não é adequada para a vida nos Andes Centrais, pois considera fundamentalmente a paisagem da Floresta Amazônica. Do mesmo modo, a cultura dos incas, no Peru, forjada pela natureza inóspita das altas montanhas andinas, não se adapta às terras baixas e planas do grande Pampa. Uma cultura torna-se tão circunscrita à paisagem que tem dificuldades de se adaptar a outros lugares. Tal restrição ocorre porque quando uma cultura domestica a paisagem ao longo do tempo ela ajusta os instrumentos culturais, desde habitação até visão de mundo, àquele lugar. O processo de domesticação não é outro senão a transferência do DNA do lugar à cultura, e vice-versa, de modo que ambos se pertençam. Isto é, ao ver a paisagem, logo identificamos o personagem que a habita, e, ao ver este, de imediato pensamos na paisagem.

Quando a paisagem é domesticada, passa a ser importante ingrediente de coesão de grupos humanos. Toma parte das qualidades peculiares de um povo, integrando-lhe o caráter, o modo de ser, como em “ser gaúcho”, ou “ser pampiano”, “serrano”, “missioneiro”, “litorâneo” etc. Fazemo-nos pertencer ao lugar, às vezes, sem mesmo conhecê-lo apropriadamente. Embora possamos não ter visitado todas as paisagens do Estado, dizemo-nos mesmo assim “gaúchos”, às vezes sem nem sequer ter saído do lugar em que nascemos. Por força do hábito, podemos enxergar para além da própria realidade da paisagem, e a vemos mais do ponto de vista cultural que do ponto de vista da descrição natural, de como ela é de fato. Como se criássemos certos mitos acerca do lugar, numa espécie de cegueira.

Por exemplo, com frequência dizemos que o Pampa gaúcho é uma “enorme planície”. Com isso, queremos fazê-lo parecer semelhante ao vasto Pampa argentino, ecorregião que abrange cerca de 600.000 quilômetros quadrados, mais do que duas vezes a área do Rio Grande do Sul. O Pampa argentino é tão extenso e as terras tão planas que a drenagem é mal definida e a água da chuva escoa com dificuldade, acumulando-se em lagos por vezes efêmeros. Originalmente, a palavra espanhola pampa, derivada do quéchua bamba, significava apenas uma pequena planície nos vales intermontanos dos Andes Centrais. Quando no século XVI os espanhóis avançaram rumo ao sul e depararam com a imensidão da paisagem de terras planas e vegetadas por gramíneas, chamaram-na de “grande pampa”.

Na verdade, a área de terras verdadeiramente planas e baixas de nosso Estado é muito pequena. Não temos nem planícies em vales intermontanos nem tampouco grandes extensões planas. Em algumas partes, o relevo é ondulado, com coxilhas e morros arredondados, canais fluviais sempre bem escavados; e, em outras, acidentado, com vales fluviais profundos, morros agudos, serras, escarpas e cânions. Toda essa morfologia ocorre na metade sul do Estado, reconhecida como pampiana.

Dito de outro modo, nosso Pampa tem paisagens muito menos monótonas que o congênere argentino. Em muitos casos, a paisagem sulina é tão peculiar que há um esforço para não vê-la, apenas para fazer de conta que somos semelhantes aos vizinhos do grande Pampa. Indiscutivelmente, nossa cultura é pampiana, o que não quer dizer que nossas paisagens sejam exatamente iguais às das demais culturas pampianas dessa vasta região meridional da América do Sul.

Há, na verdade, uma diversidade de gaúchos na mesma medida da diversidade das paisagens onde essa cultura se instalou e se expandiu. Dizem-se gaúchos os que habitam a Patagônia, onde criam ovelhas nas zonas mais amenas desse semideserto da região mais meridional e fria de nosso continente. Também se dizem gaúchos os que povoam grande parte do Chaco argentino-paraguaio e até do Pantanal Mato-Grossense, onde criam gado e tomam mate frio, o tereré. São gaúchos os que ocupam a área contígua ao Rio Grande do Sul chamada de Campos Sulinos, no vizinho Uruguai; e, claro, são gaúchos os que lidam com o gado e tomam mate quente, porém em cuia pequena, na imensa planície argentina chamada de grande Pampa.

Enfim, as vastas terras baixas e planas que se estendem desde a fria Patagônia e grande Pampa até parte do Chaco paraguaio-argentino e respectivas áreas adjacentes um pouco mais elevadas ensejaram uma ocupação humana que possui forte identidade na cultura do manejo de gado, chamada de “gaúcha”. Na ampla configuração de nosso cenário, qual seja, a parte não andina da região meridional da América, somos a porção do extremo oriente dessa cultura, habitando uma espécie de “‘pampa alto”, “pampa coxilhado” ou “pampa serrano”. Assim como também pertencem a um “pampa alto”, porém paisagisticamente distinto, os que habitam as terras elevadas no bordo oeste do Pampa argentino, mais próximo dos Andes.

Visitar o lugar do outro, do vizinho, do estrangeiro longínquo, é sempre um exercício cognitivo e cultural que ajuda a descobrir a própria paisagem para além do hábito que cegamente vamos mantendo. Do mesmo modo, quando outras pessoas que não moram onde vivemos vêm descrever “nosso lugar”, aprendemos a ver a terra pelos olhos daqueles que não estão a ela habituados, isto é, embebidos em uma espécie de cego encantamento.

O hábito, por ser muito afeiçoado ao lugar, não permite que vejamos a paisagem a partir de outras perspectivas ou pontos de vista que não sejam “o nosso”, quer dizer, de nossa identidade cultural aderida ao território. Por isso, as narrativas de viajantes sempre foram um gênero literário de muito sucesso em todas as épocas. A começar pelas mais antigas, como as Historias do grego Heródoto, o “pai da História”, que no século V a.C. descreveu no livro II o mundo egípcio com horror e fascínio e nos fez ver que cultura, etnografia e história pertencem ao lugar. Ou as do veneziano Marco Polo, que narrou no livro Il Milione a viagem ao então estranho mundo oriental no século XIV. Ou as consagradoras descrições dos naturalistas românticos do século XIX, em que se incluem as de ilustres sábios que visitaram o Rio Grande do Sul, como Auguste Saint-Hilaire, Aimé Bonpland, Friedrich Sellow, entre outros.

O trabalho de naturalistas e viajantes constitui fonte de conhecimento de nossa paisagem a partir de outras perspectivas. Mais além, são também uma memória das mudanças paisagísticas que ocorreram desde épocas em que os únicos instrumentos de registro eram a escrita e o desenho em cadernetas de campo. Os trabalhos poderiam ser acompanhados de coleta de espécimes vegetais, animais e minerais, bem como de belas aquarelas. No século XX, principalmente a partir da consolidação dos cursos universitários de História Natural nos anos 1950, os relatos de viagem que integravam várias modalidades disciplinares foram perdendo terreno, e o gênero quase desapareceu.

Por isso, a publicação desta obra do fotógrafo Zé Paiva é motivo de grande e estupenda alegria. Utilizando-se de recursos modernos, do arsenal de equipamentos fotográficos e adequada logística, brinda-nos com uma incursão pela paisagem gaúcha que recupera a ideia dos percursos de uma viagem naturalista. Em vez de longos textos, Paiva apresenta uma obra numa linguagem visual própria da contemporaneidade. Mas suas fotografias não são a busca do óbvio, de imagens já muito difundidas em cartões-postais. Longe disso, o autor apresenta sequências inseridas dentro de incursões pela paisagem do Escudo Sul-Rio-Grandense, Planalto Meridional, Depressão Periférica e Planície Costeira. Os percursos, por sua vez, são localizados dentro da diversidade de paisagens que compõem as ecorregiões gaúchas.

Assim, o leitor poderá acompanhar o espírito de aventura, de busca, de investigação de um amplo espectro de temas que conformam o DNA de uma paisagem. Dos elementos rochosos, vegetais, animais, capturados em detalhes de rara composição. Do conjunto paisagístico denotado pelas formas do relevo, nuvens e cores do céu. De expressões culturais de habitantes de regiões distantes, ermas, onde se fabrica a simbiose dialética entre cultura e paisagem. São flagrantes fotográficos que anunciam nossa condição neste mundo: de espectadores e, também e cada vez mais, de modificadores da paisagem.

A incursão de Zé Paiva é uma busca instigante da natureza recôndita, aquela que ainda está de alguma forma guardada em parques e áreas de preservação. É um modo sutil de anunciar o pouco que resta e o tanto que perdemos ou que ainda podemos perder. Por ser fruto de um viajante que segue os passos da cognição naturalista, a obra tem perspectiva, tem posição: a de mostrar em cada flagrante como a natureza é bela e diversa na sua própria naturalidade, isto é, para além dos clichês habituais que porventura aprisionam as múltiplas paisagens de nosso Estado.

Botando banca na ESPM

Sábado passado, fui a Porto Alegre para participar da “banca” da quarta turma do curso avançado de fotografia digital da ESPM. Banca entre aspas, porque na verdade não iríamos dar nota para os trabalhos. A intenção era mais apontar possíveis caminhos e comentar os portfólios resultantes do trabalho de conclusão do curso. O nível geral dos trabalhos foi muito bom. Um diversidade enorme na forma de apresentação dos portfólios: alguns em ampliações enormes com paspatur e caixa, outros menores, outros sem paspatur e sem caixa, tinha até um numa maleta com cadeado! A diversidade de temas era grande também: nús, moda, arquitetura, natureza, e outros. Tecnicamente todos os trabalhos estavam bons. A maioria pecava pela falta de unidade no conjunto, o que é um problema de edição. Isso é normal quando se edita o próprio trabalho, pois o apego interfere na escolha das fotos. A dinâmica do trabalho foi a seguinte: de manhã nos reunimos no estúdio da ESPM, onde os integrantes da banca, eu, Ricardo Chaves, o Cadão, editor de fotografia do jornal Zero Hora, Eduardo Veras, professor, crítico de arte e ex-editor do segundo caderno da Zero Hora, e Guilherme Lund, fotógrafo e professor da ESPM, acompanhados do coordenador do curso, o professor Manuel da Costa, analisamos os portfólios impressos durante a manhã toda. A tarde houve uma projeção dos trabalhos seguida dos nossos comentários. No final houve um coquetel na galeria de arte da ESPM. Muito interessante a diferença entre ver o mesmo trabalho impresso e projetado, muda bastante. [slideshow]

Oficina em Porto Alegre – making off

A oficina que dei no fim-de-semana passado em Porto Alegre, na Escola Câmera Viajante, foi ótima em todos os sentidos. Sábado iniciamos as 9 da manhã, com a turma lotada (14 alunos, faltou uma por motivo de doença na família). Passei o dia dando elementos teóricos alternados com projeções e dinâmicas. Foi bem produtivo e o pessoal assimilou bem os conteúdos. Domingo, saímos as 7h30 da manhã de van para a nossa aula prática no belíssimo Parque Estadual de Itapuã, em Viamão, onde fomos recebidos pela bióloga Deise, uma simpática nordestina . Ela falou um pouco sobre a história do parque no auditório do centro de visitantes e depois fomos pra Praia de Fora, que fica na Laguna dos Patos.

Praia de Fora, Parque Estadual de Itapuã, foto de Gelson Rocha.
Praia de Fora, Parque Estadual de Itapuã, foto de Cláudio Tarta.

O dia estava ótimo, melhor que a encomenda. Caminhamos até o canto direito da praia, margeada pela laguna por um lado e um cordão de dunas pelo outro. A pauta era, paisagens vivas, texturas, fauna e macro. Voltamos para a nossa van e seguimos para a Praia da Pedreira, no Lago Guaíba, onde fizemos um piquenique de almoço. A tarde fotografamos um pouco por ali e depois fomos fazer a trilha do Pico da Visão, que sobe até um mirante natural de onde se vê, de um lado o Lago Guaíba, e de outro, a Laguna dos Patos e toda a Praia de Fora. Deslumbrante.

Resquícios de antiga pedreira na trilha para o Pico da Visão, Parque Estadual de Itapuã, foto de Gutemberg Ostemberg
Praia das Pombas, Parque Estadual de Itapuã, Foto de Vera Lúcia Ambrozi
Praia das Pombas, Parque Estadual de Itapuã, foto de Lisandre Rockenbach

Na volta fomos até a Praia das Pombas fazer o por-do-sol, que estava lindo. Na segunda a noite 19 horas, fizemos uma reunião de três horas para avaliar o material obtido. No início demonstrei como eu edito meu material usando o adobe lightroom e como faço meus P&Bs no mesmo software. Depois comentei as fotos dos alunos (uma seleção de 8 por pessoa). A turma era muito legal e nos divertimos bastante o tempo todo. Além disso, a escola Câmera Viajante está bem localizada (bairro Moinhos de Vento) e bem estruturada e os proprietários, Karla e o Rogério, me deram todo o suporte  e estrutura necessárias. Agradeço a todos e até o próximo workshop!

Fotambiental – que bicho é isso?

Uma oficina que vai expandir a sua sensibilidade pois eu valoriza o conceito tanto quanto a técnica. Pensar antes de clicar. Deixar a emoção falar mais alto do que a câmera. Como? Se você fizer a oficina vai descobrir. Veja mais detalhes no site da Câmera Viajante.

Sarau de fotografia na FNAC – as fotos

Foi dia 13 de setembro. Trata-se de um evento mensal da FNAC em parceria com a Escola de Fotografia Câmera Viajante, de Porto Alegre. Neste Sarau fui convidado para falar do meu trabalho. Falei sobre os projetos Expedição Natureza Santa Catarina e o Natureza Gaúcha, já lançados, e sobre o trabalho em curso no Tocantins. O público lotou o espaço Blu-ray na FNAC, que aliás estava sendo inaugurado. Na verdade faltou cadeiras para o público presente, ficou gente de pé (sorry)! Em compensação a FNAC teve a gentileza de oferecer um ótimo espumante e frutas secas enquanto eu autografava o livro Natureza Gaúcha.

Na ocasião também foi lançado oficialmente o meu próximo workshop de fotografia ambiental (gostei do termo ambiental, no lugar de natureza, mais abrangente), que será na Câmera Viajante, de 23 a 25 de outubro. Sábado será aula teórica na escola. A aula prática, no domingo, será no belo Parque Estadual de Itapuã, em Viamão. Na segunda-feira teremos uma aula de avaliação.  Já restam poucas vagas, por incrível que pareça, assim que quem quiser se adiante antes que lote.

Abaixo algumas fotos do evento:

Sarau de fotografia - FNAC Porto Alegre em 13 de setembro de 2010 - foto de José Otávio Teixeira.

 

Zé Paiva e Rogério do Amaral Ribeiro da Câmera Viajante, Sarau de fotografia - FNAC Porto Alegre em 13 de setembro de 2010 - foto de José Otávio Teixeira.
Sessão de autógrafos, Sarau de fotografia - FNAC Porto Alegre em 13 de setembro de 2010 - foto de José Otávio Teixeira.

Imago – novo livro de Felizardo

Rolodex, de Luiz Carlos Felizardo

O grande fotógrafo portoalegrense Luiz Carlos Felizardo lança em julho, seu novo livro Imago, que reúne textos do autor publicados na revista Aplauso, onde é colunista desde 2001. O título é produzido pela Lathu Sensu e financiado pelo FUMPROARTE. Aqui no blog você pode conferir um destes textos, intitulado “Reduto de Artistas“, sobre o meu livro Natureza Gaúcha e sobre o livro Porto Alegre de Eurico Salis.

Para Felizardo, a fotografia “É um mundo vasto, sim. É uma das poucas formas de produção de imagens que pode ser feita e entendida ou como registro histórico, ou documento, ou informação jornalística, ou instrumento de pesquisa científica — ou arte. E, frequentemente, é mais de uma coisa ao mesmo tempo.”

Nascido em 1949, Luiz Carlos Felizardo estudou na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) entre 1968 e 1972, ano em que deixou o curso e passou a dedicar-se exclusivamente à fotografia. Utilizando câmeras de grande formato, produziu obras reconhecidas internacionalmente nas áreas de fotografia de paisagem e arquitetura.

A partir de 1975, realizou mostras individuais em diversas cidades brasileiras, em Buenos Aires e La Plata, na Argentina, e em Montevidéu, no Uruguai. Participou também de coletivas internacionais em países europeus, como La Fotografía Iberoamericana, em Madrid; Brasilianische Fotografie, na Alemanha; e Fotografía Brasileña: Historia y Contempo-raneidad, em Portugal. Em 1991 e 2006, teve  imagens selecionadas para integrarem o acervo da Coleção MASP/Pirelli.

O lançamento de “Imago” acontece às 19 horas de 6 de julho, no restaurante Moeda do Santander Cultural, na rua 7 de Setembro,  1028, em Porto Alegre.

Zé Paiva na Feira do Livro de Porto Alegre

Dono de um trabalho autoral que presta tributo à natureza, o fotógrafo e professor da Escola de Criação Zé Paiva vai estar na Feira do Livro no próximo domingo, dia 8 de novembro. Às 14h30, ele autografa o livro Expedição Natureza Gaúcha, uma viagem fotográfica pelo pampa, a serra e o litoral do estado. Foram 5 mil km e mais de 15 mil imagens, das quais 150 estão no livro.

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Em março deste ano três fotos deste trabalho foram selecionadas para a coleção Pirelli MASP, a mais importante coleção de fotografia do Brasil. Uma delas aparece na entrevista que publicamos com o Zé Paiva na semana passada. Mas neste post a gente trouxe outra imagem, que o Zé Paiva veio ao blog comentar:

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Reserva Biologica do Sao Donato, Itaqui, Rio Grande do Sul, Brasil. Foto de Ze Paiva, Vista Imagens

“Depois de uma tarde perseguindo bugios espremidos em pequenos resquícios de capões de mata nativa entre arrozais dentro da Reserva Biológia de São Donato, em Itaqui, fomos ver o pôr-do-sol em uma pequena lagoa na beira da estrada. Divagando sobre a vegetação na margem comecei a brincar compondo apenas alguns juncos e deu no que deu, o cúmulo da simplicidade fez valer o ditado “menos é mais”. Por isso talvez a foto ganhou o apelido de japonesa.”

Por Luiza Piffero, no blog da Escola de Criação da ESPM Porto Alegre.

Natureza Gaúcha na Feira do Livro de Porto

Meus caros, domingo dia 8 de novembro de 2009 as 14h 30 estarei relançando meu mais recente livro, Expedição Natureza Gaúcha, na Feira do Livro de Porto Alegre, com uma sessão de autógrafos. O evento será na Praça de autógrafos da Feira, na bela Praça XV, no centro da cidade, rodeado pelos jacarandás em flor. Estão todos convidados, assim como os amigos e os amigos dos amigos…

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Expedição NATUREZA  GAÚCHA
Livro  fotográfica
Autor: Zé Paiva
Lançamento: 8 de novembro, domingo, a partir  das 14h30min
Local: Praça de autógrafos da Feira do Livro de Porto Alegre
Endereço: Praça XV – Porto Alegre/RS
Editora: Meta Livros – 144 páginas
Português-inglês

Patrocínio:
Eletrobrás
Banrisul
Ministério da Cultura – Lei Rouanet
Apoio:
Governo do Estado –  RS
Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Fundação  Zoobotânica
Ibama

Reduto de artistas

Caros amigos

Abaixo transcrevo o excelente texto do grande fotógrafo e amigo Luiz Carlos Felizardo publicado na revista Aplauso nº 95 de 2008, na sua coluna Imago, sobre o meu livro “Natureza Gaúcha” (Editora Metalivros) e sobre o livro “Porto Alegre – cenas urbanas, paisagens rurais” de Eurico Salis. Boa leitura!

Travessa dos Venezianos, foto de Eurico Salis.
Travessa dos Venezianos, foto de Eurico Salis.

Dois livros foram lançados há pouco, um de Eurico Salis (Porto Alegre — Cenas Urbanas, Paisagens Rurais), outro de José Luiz Martins Paiva, o Zé Paiva ( Natureza Gaúcha). Ambos são belas edições, bem produzidas e acabadas, o do Zé Paiva feito em São Paulo, o do Eurico por aqui mesmo, com qualidade equivalente (o que mostra que nossa indústria gráfica vai bem, obrigado). Ambos os trabalhos demonstram dedicação extrema aos assuntos que abordam, não apenas pelo fôlego e competência com que cobrem áreas extensas, mas pela qualidade das fotografias que os compõem.

Mas existe algo além das fotografias que os destaca e atiça minha curiosidade: há uma mesma cidade e uma região na raiz dos dois trabalhos — o Eurico é de Bagé, começou lá a fotografar, e o Zé, que vive em Santa Catarina, mesmo tendo nascido em Porto Alegre está ligado a Bagé por suas duas famílias e por incontáveis férias de infância vividas por lá, na fronteira com o Uruguai.

A mesma região está presente nas raízes de Leonardo Costa, outro fotógrafo bageense, autor das capas da primeira Isto É. E eu mesmo, nascido e criado em Porto Alegre, sempre atribuí ao tempo passado em Bagé, na fazenda em que vivia meu padrinho, o início da minha paixão pela paisagem, pelos grandes espaços e pelo silêncio das coisas. Não por acaso, das sete fotos do ensaio que publiquei no 1º Almanaque Socioambiental, sobre a região do pampa, cinco nasceram em Bagé. Nem é acaso que minha exposição Querência tenha sido produzida, predominantemente, nos campos e galpões de Bagé.

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Dunas no Parque Nacional da Lagoa do Peixe, foto de Zé Paiva.

Quê diabos tem essa cidade para que sua influência tenha gerado tantos fotógrafos (e artistas, como se verá)? Como é que uma região estigmatizada pela “grossura” gaúcha pode produzir tanta gente sensível? A incongruência aparente já rendeu a figura do notável Analista de Bagé… Se nosso olhar for um pouco mais amplo, saberemos que, em 1948, Glauco Rodrigues, Danúbio Gonçalves e Glênio Bianchetti, os três bageenses, constituíram o Grupo de Bagé, consolidado mais como o Clube de Gravura de Bagé. Do grupo também participou o ótimo, nunca suficientemente lembrado Avatar Moraes – bageense do Rodeio Colorado.  A Danúbio, se atribui a frase  “Quando eu viajava para Bagé, de trem, via os pessegueiros em flor —  e via Van Gogh.”, que pode  
servir de pista para que se comece a compreender um pouco do mistério. Glênio, com quem acabo de conversar por telefone, anda faceiro com o restauro dos espaços da antiga vila de Santa Tereza (que conheci muito bem quando menino), que incluem a capela – que abrigará uma nova obra dele — criando em Bagé mais um espaço cultural.

Mas não se pára por aí: o hoje fotógrafo Leopoldo Plentz foi casado com uma bageense e fez lá sua primeira exposição (de desenhos e gravuras), também de Bagé é o fotógrafo Cacalos Garrastazú, e Artur Poester, fotógrafo (irmão da Teresa, artista bem conhecida, também presente nos resultados do restauro de Santa Tereza) casou com Helena, filha do Severino Collares, sujeito fantástico, misto de estancieiro, anfitrião de artistas, incentivador do Grupo de Bagé e das artes em geral – todos, desnecessário dizer, bageenses. Um dos bageenses mais bageenses que eu conheço, o grande arquiteto (portanto artista) Nelson Saraiva, morava, quando criança, a poucas casas de um dos avós do Zé Paiva – e, como ele, vive há muitos anos em Florianópolis. Ou seja, fecha-se o círculo das coincidências.
Coincidências? Só pode achar que a relação entre Bagé e as artes situa-se nesse terreno quem deixar de ler o excelente texto de Rualdo Menegat (O DNA da paisagem) que introduz o livro do Zé Paiva, onde ele diz: “A identidade de cada pessoa é indissociável da paisagem e do lugar onde nasceu.” Só pode considerar coincidência essa relação tão estreita quem desconhecer as idéias de Pedro Nava, cujas palavras foram usadas como epígrafe de minha exposição Querência:
“Essa áreas, não posso chamar de pátria, porque não as amo civicamente. O meu sentimento é mais inevitável, mais profundo e mais alto porque vem da inseparabillidade, do entranhamento, da unidade e da consubstanciação. Sobretudo, da poesia… Assim, onde é que já se viu um pouco d’água amar o resto da água? Se tudo é água… Essa é a minha terra. Também ela me tem e a ela pertenço sem possibilidade de alforria. Do seu solo, eu como. Da sua água, eu bebo. Por ela serei comido”.

Por Luiz Carlos Felizardo, publicado na revista Aplauso nº 95 de 2008.